"You tell me we can start the rain
You tell me that we all can change"
Rainmaker - Iron Maiden
(Dave Murray/Bruce Dickinson/Steve Harris)
Achava que já estava completa, de tantas convicções que carregava dentro de si. Sempre foi alegre, distribuindo por aí pitadas aleatórias de intensidade e revestindo de otimismo todos os acontecimentos, como se se preparasse constantemente para um baile de Carnaval.
Até que um dia deparou-se com um azul. Ficou desconcertada com tanto deslumbre. Era de um tom que ela nunca havia visto antes, desses que a gente não encontra em mostruários; só sob encomenda.
Numa determinada manhã, daquelas bem calminhas, a moça das convicções saiu para caminhar numa praia desconhecida, lugarzinho perdido num canto esquecido do mapa. Levou com ela o azul, ávido por encontrar mais cores. Então, num dado momento, desses que o relógio esconde quando o mundo pára em forma de deserto, sentaram-se à beira-mar para olhar para o horizonte.
À frente deles havia verde, um pouco do bege da areia, o branquinho de quando as ondas quebram, várias nuanças de marrom cobrindo pedras e uma vastidão de cinza maciço, como se o céu tivesse se vestido mais sério só para se impor em silêncio.
Foi aí que viram, no mesmo horizonte para onde olhavam, uma nuvem chuvosa carregadinha de de-repente vindo na direção deles. Mais ninguém ao olhar para a direita. Mais ninguém ao olhar para a esquerda. Só ela e o azul, as outras cores e a chuva iminente, trazendo água para, quem sabe, desbotar tudo numa lavagem inocente.
Então, com uma coragem serena, dessas que não se compram a granel, permaneceram ali, quietos. Não correram. Não falaram. Pensavam aquarela enquanto esperavam a nuvem chegar.
Foi quando choveu. Forte, torrencialmente, numa sucessão de pingos grossos ensopando tudo. Decerto a chuva seria passageira, dessas de verão que atravessam outras estações em forma de imprevisto.
De súbito, debaixo daquela chuva, a moça das convicções viu todas escoarem para o mar, deixando-se chover também, completamente despreocupada. E, daquele dia em diante, ela nunca mais foi a mesma.
Dizem que a culpa é daquela aguaceira toda. Mas alguma coisa dentro dela sabe que foi a cumplicidade do azul.
9 comentários:
Agora que você escreveu esse texto, me lembrei de todas as vezes que me deixei chover... e no quanto estou completamente tempestade esses dias!
Beijos
Laís
A senhora escreve muito bem, e este foi o melhor texto seu que eu já li.
Meus mais sinceros parabéns.
Acompanho o seu blog há um certo tempo, e sempre me surpreendo com algo excelente.
Também tenho um blog, e ficaria muito feliz se a senhora pudesse dar uma olhada e comentar:
http://castor-ensimesmando.blogspot.com/
meu e-mail: erva@doalem.com
Sim, senhora. Melhor azul que sépia, não é, ainda mais um azul especial. Só falou uma coisa: nos marcadores colocar "poesia", pois é disso que trata o texto com esse lirismo absurdo que vc tem.
uauuuuuuuuuuuuuuu!:)
Parabéns!
É engraçado...é exatamente como estou me sentindo...a tempestade está sobre mim...vou deixar chover para, quem sabe um dia, conseguir ser diferente!!
Sempre leio seus textos, mas este...de alguma forma mexeu comigo!
Kandy, seu lindo texto me trouxe à mente o seguinte trecho de uma música: "Eu sou nuvem passageira, que com o vento se vai... eu sou como um cristal bonito... que se quebra quando cai..."
Eu ando super tempestade. Nem o azul me consola ou apazigua as coisas...
Logo mais eu volto à minha garoa fina e, de preferência, ao céu de brigadeiro.
Amo seus textos, já te falei isso com a freqüência necessária?
;)
Kandy,
que texto lindo...
estava com saudades de ler seus textos, finalmente arranjei um tempo pra isso...
Parabéns !!!
Puxa, juro que meu feed não tinha mostrado a atualização...
¬¬
Vim conferir se tinha tanto tempo assim que vc tinha escrito o último texto e me surpreendi com esta maravilha.
=)
Hoje eu estou ensolarado!
^^
parabéns Kandy...
acho q a questao é a complexidade da cor...
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