02 novembro 2007

Eu não sou fiel

Não vou pedir desculpas, porque não me envergonho do que fiz. Eu traí. Deixei a lealdade em casa e saí, com o maior sorriso na cara, esperando o inusitado, o gostinho de novidade. Foi mesmo uma aventura, que é que tem?

Ninguém descobriria, porque fiz tudo bem-feito. Mas achei melhor falar. Não, não, isso não é drama de consciência, culpa, nada disso. Eu repetiria a dose outras vezes, porque foi muito bom. Uma adrenalina boa de sentir e prazer antes, durante e depois. Só se eu fosse louca para me arrepender.

Há quem diga que é falta de personalidade, fraqueza, mania de querer abraçar o mundo, literalmente. Não sou dessas. Acreditem: foi a primeira vez, um ato deliberado, friamente planejado, com dia e hora marcados. Sou decidida. Foi depois do trabalho, na última quarta-feira de outubro.

Eu torci para dar certo. Gritei muito, embora tenha tido umas crises de identidade esporádicas. "Então, é assim que um traidor se sente?" Difícil explicar a dualidade. Meus sentimentos eram sólidos em relação às minhas convicções de sempre, mas aquele desvio era excitante demais. Eu continuava amando o que ia no meu coração, mas estava gostando muito do que se passava diante dos meus olhos, do que meus ouvidos ouviam, do meu batimento cardíaco acelerado esperando o ápice. E foram três. Sou mesmo uma mulher de sorte.

Fui covardemente seduzida. Meu ponto fraco: a razão. Foram argumentos irrefutáveis e uma oportunidade e tanto de entender mais o ser humano. Como ele se comporta numa situação dessas? O que sente? O que o leva a se sujeitar a isso? A sensação é tão boa assim? É.

Podem falar o que for. Traí bonito, com fogos de artifício e tudo. E o pior: sabia que estava sendo filmada. Eu sou assim: dou a cara a tapa. Assumo o que faço e não ligo para o que os outros pensam. Julguem-me como quiserem. E vou além: todo mundo deveria, pelo menos uma vez na vida, ter uma experiência dessas.

A traição aconteceu num estádio. Nunca havia pisado em um. Foi no jogo do São Paulo contra o América do Rio Grande do Norte. Foi no meio da torcida, na arquibancada mesmo. Muitíssimo bem acompanhada. Tudo se deu ali, no meio daquela energia contagiante, das emoções à flor da pele, do anônimo uniformizado, entre bandeiras e palavrões. Foi tórrido e inesquecível.


Uma corintiana desde a infância, que deveria estar ao lado do time num momento de desespero, quando ele está com um pé na segunda divisão, ali, prestigiando o pentacampeão, um dos arquiinimigos. Vestindo a camisa. Cantando o hino. Fazendo ola. Gritando olés. Ovacionando o Rogério Ceni. Batendo palmas. Boquiaberta com a visão tão panorâmica. Entusiasmada por, finalmente, entender a paixão nacional.

Tenho o Corinthians no coração, meu relacionamento estável. E, agora, uma queda inexplicável pelo São Paulo, de quem me tornei amante.

Uma traidora, eu.

Tudo porque me dei conta de que, definitivamente, eu não sou Fiel.



Dedico este texto

Aos são-paulinos do meu coração: Keyla, Alexandre Tadeu, Fernanda e Milton.


E aos corintianos a quem peço perdão: Noé, Priscila, Jana, Rodrigo e Mauricio.



21 comentários:

Ricardo disse...

Tsc, tsc, que coisa feia! Coisa de gente sem princípios mesmo.
Este comentário é assinado pelo meu lado palmeirista.

Ricardo disse...

Como amigo, eu já sabia da história e do consequente texto, o que tirou um pouco da surpresa.

Como fã, o texto está irreprochável, de um humor fino, que deixa o leitors ávido pela sex gratification insinuada.

Parabéns, outra vez. Agora o amigo escreve o comentário, preferências ludopédicas à parte.

Anônimo disse...

Vc descreveu a mesma sensação que tive ao pisar pela primeira vez no sambódromo. Apesar de ter sido sempre torcedora da Rosas de Ouro, desfilei na Barroca e na Nenê com os olhos marejados e a respiração presa. Dizem que o futebol e o samba provocam a mesma emoção e eu concordo. Emoção não tem bandeira, nem nome de clube ou escola. Depois disso nunca mais seremos as mesmas...

Unknown disse...

Como verdadeira São Paulina que sou, no momento: vestindo a camisa, com a bandeira pendurada na janela e cheia de contentamento pelo Pentacampeonato, fico muito feliz em saber que você simplesmente adorou ir ao estádio.
Ainda mais no Morumba, no meio da arquibancada, gritando e xingando o juiz (o que deve ter feito muito), pulando e cantando junto com toda a torcida e a cada gol (no qual foram 3), ver e sentir o Morumbi tremer!!!!! É uma sensação, inexplicável, inigualável e maravilhosa, né?!
Então quer lhe dar os parabéns não só pelo texto, mas pela coragem de ir ao estádio. Mas só faltou uma coisa para ficar completo o seu dia (uma coisa que você precisa superar): comer sanduíche de pernil na barraquinha.... hahahaha

Anônimo disse...

POética até falando de futebol !!!
Muito bom o texto Kandy...
E não se preocupe com a traição, ela pode ser revigorante para a vida...

Parabéns !!!

Balu disse...

Olá Prima!
Há quanto tempo...Em breve mando um mail a actualizar as novidades!

Quanto à infidelidade...não faz mal, foi por uma emoção maior!
Eu não sou amante do futebol mas não nego a excitação sentida quando também me vi num estádio repleto a gritar, neste caso não pelo adversário mas por PORTUGAL!!

Sabe muito bem, não te importes!

Beijinhos
Até breve

Daniela Valverde disse...

Olá Kandy. Entendo o que se passa com você. Eu também já fui "vira-casaca", como dizia minha avô. Quando criança, era são paulina, pela deliberada influência de meu pai. Mas o tempo me mostrou meu time de verdade, o Timão. Há pouco tempo tive a oportunidade de ver o Corinthians jogando, no Pacaembu. Escrevi sobre isto no meu blog. Dê uma olhadinha: http://1daystand.blogspot.com/2007/09/no-estdio-com-torcida-de-arrepiar_06.html
Ah, adorei seu blog!

Bjs

Daniela
1daystand.blogspot.com

Cléu Sampaio disse...

Ai que delícia de texto! Até eu que nem ligo pra isso fiquei com vontade de ir a uma partida!

Beijo, Kandy.

Unknown disse...

Kandylee,

São muitas coisas pra falar...

1º Ótimo seu texto!
2º Sensações muitíssimo bem explicadas
3º Humor negro.. ou seria rubro-negro?
4º Até que enfim vc foi a um estádio (porque sempre me chamou de louca quando eu ia...)
5º Espero que essa nova paixão perdure... afinal é sempre melhor ter uma irmã são-paulina do que uma corinthiana... heheh
6º Bendito seja o iluminado que te fez ver o que é futebol!!!
(finalmente, porque se dependesse do seu time.. ia ser meio difícil mesmo!)

Enfim, continue torcendo, continue pegando gosto pela coisa, afinal a copa chegará e será muito bom podermos pelo menos torcer para o nosso Brasil juntas (já que vc não quer mesmo ir a um jogo do Palmeiras comigo).

Beijotchau...

Unknown disse...

Em tempo: A Keyla tem razão e eu já havia dito isso a você:
O lanche de pernil da barraquinha é muuuuito bom! Mas vamos com calma.. o mais difícil vc já fez. Tenho certeza que o resto vem com o tempo !

Vinícius Rennó disse...

Eu também não sou Fiel. Aliás, em relação ao futebol me considero ateu. Acho tão difícil entender o porquê das pessoas gostarem desse jogo em que 22 marmanjos correm atrás de uma bola.

Anônimo disse...

Opa, então já tá bom pra virar são-paulina, hehehe! \o/ Mais uma convertida!

Kandy disse...

Daniela, seja bem-vinda ao Idéias!

Kelly e Ricardo: eu ainda sou bem corinthiana, porque jamais iria a um jogo do Palmeiras. A não ser que fosse para torcer contra ele.

Keyla e Kelly: comer em camelô está fora de cogitação. Meu estômago não agüenta... :-(

Vinícius, você já assistiu a um jogo de futebol em um estádio? Lá, talvez, você entenda o que comove as pessoas e o porquê de o futebol ser assim, apaixonante...

Cleu, se tiver oportunidade, vá, sim, ver uma partida. Você vai se divertir muito!

Trotta: vamos com calma com o andor. Eu ainda não me converti... Por enquanto os dois times convivem (?!) em mim... Mas que está um duelo interessante, ah, isso está!

Anônimo disse...

Estou chocado com a revelação. Mas enfim, é compreensível. Já fiz namorada palmeirense ir ao Brinco de Ouro da Princesa para torcer pelo meu Guarani...

Anônimo disse...

Kandy, você é a traidora mais sensacional que conheço! Vá em frente!
Eu também estava lá, comemorando mais uma vez um título brasileiro, assim como fiz em 1986, 1991 e 2006 - em 1977 não dava, né? E sem falar nas Libertadores de 1992, 1993 e 2005.

Ricardo Montero disse...

Largar o Corinthians é a prova de que sempre podemos evoluir. Afinal, eu acredito na espécie humana! Ainda que não seja são-paulino, meus parabéns, Kandy!

Vinícius Rennó disse...

Na Idéia da vez, não seria melhor "Cada um vê o mundo de um ângulo, porque duas pessoas não ocupam o mesmo lugar na janela"?

Anônimo disse...

Kandy, vc me enganou direitinho. :) Mas eu adorei. Sei que a traição valeu a pena porque foi com o São Paulo. ;)
Beijo

Anônimo disse...

tá perdoada, pq, musicalmente e politicamente falando, eu já pulei a cerca, rs...
beijinho,
Jana

Priscila disse...

Oie...
Faz tempo que não entro no seu blog, mas como sempre está muito interessante.

Eu tenho que dizer que realmente gosto de futebol e que a minha paixão pelo Corinthians começou assim como a sua, indo a um jogo no estádio. Meu pai me levava e até tinha um lanchinho depois (aquele tal que já citaram...rs).

Quanto a sua traição ao meu todo poderoso timão (rsrsrs), eu entendo né, fazer o que, não estamos tão bem quanto o "outro".

Muitos beijos da sua cunhada corinthiana.

Anônimo disse...

Lamento. Desculpe minha sinceridade, mas infelizmente o Corinthians não tem a torcida perfeita, por mais que nos esforcemos. Há, nela, torcedores como vc, que o vêem pela tv, dizem que sofrem, dizem que torcem, e vão ao estádio vibrar numa outra geral, de uma outra cor, de outro brasão.
Enfim. Espero que vc mude de time. Será mais feliz, seguramente.