22 junho 2008

Fome


O corpo esticado sobre a cama forrada de lençóis lisos, as mãos enlaçadas atrás da nuca, evidenciando os bíceps, mostravam que era todo curvas, em temperatura ideal para o tato.

Permanecia com as pálpebras ligeiramente cerradas, feito milharal em época de colheita, embora não deixasse os pensamentos serem ceifados por observação alheia. Escondia ali um par de castanhas.

Sorria com o canto dos lábios finos, numa educação contida demais para um momento sem ponteiros. Ofereceu um pouco de chá branco, tal qual o lençol. Tinha gosto de maçã. Um pouco verde, talvez. Irrelevante. A embriaguez era mesmo de vinho.

Apesar da miopia, proferia palavras nítidas, que emendava num português quase perfeito envolto num timbre de pêssego. O humor era doce; o toque, sussurrado como quem acaricia uma onda sem molhar as mãos; o desejo, exalado por poros contemplativos, fincados na degustação do agora.

E não importavam os olhos que o admirassem, fossem anis, de quiuí ou de chocolate. E não importava o perfume, se de amêndoa, adocicado ou cítrico. Quer fosse um aperitivo, uma entrada, uma sobremesa ou um banquete, pedia era para ser devorado. Só assim sentir-se-ia satisfeito.

Nascera para a tentação, porque abria qualquer apetite.

7 comentários:

Ricardo disse...

Você é como o Lobato: pinta com as palavras.

Ricardo disse...

PS: só não gostei do quiuí. Pra mim é igual pitiça de muçarela.

Bruno Peres disse...

Amo seus textos..
principalmente esses todo poéticos...

Muito bom kandy...
Não vejo a hora que você saia do seu emprego e possa se dedicar mais a esta arte...

Beijos

Kandy disse...

Ricardo, eu prefiro a grafia "quiuí" ao estrangeirismo kiwi porque este último pode ser lido /quiuí/ ou /quivi/, visto que o w tem dois sons. Mas quivi é uma ave típica da Nova Zelândia. Como você sabe, prefiro ser sempre específica e, embora não seja xiita a ponto de abminar estrangeirismos, uso-os apenas quando necessário. É horrível escrever "pítça" como sugere a Academia, tanto é assim que os dics mais conceituados ignoram o fato, com muito bom-senso. Mas esses mesmos dics conceituados, no verbete kiwi remetem o leitor à grafia aportuguesada "quiuí". É uma questão de estilo. Nem por isso recrimino quem prefere escrever com k e w. Só achei que devia explicar essa minha escolha... coisa de quem faz dicionário... ;-)

Vinícius Rennó disse...

Realmente, isso acontece de repente nessas terras d'além-mar, onde o sol vôa baixo e nos aquece o sangue até arfar.

Por isso tenhas cuidado! Aquele que devora, em demasia também será devorado. Do mesmo modo que o vinho renova o desejo pelo beijo da taça quando esta esvazia.

Mas não ficais triste se tudo se consumir e, eventualmente, se estingüir. Pois ao final, assim como no começo, sempre nos restará a poesia.

Ricardo disse...

Desta vez passa. rsrsrs

Eu entendi, eu que sou implicante mesmo.

Bacci, ops, beijos!

GNews disse...

Seus textos são fabulosos! Me faz imaginar cada palavra e sentir cada linha...sinceramente espero um dia poder comprar um livro seu!!!

Beijos!! T+

Gabrielle Andrade!
Uberlândia