02 junho 2006

De corpo e alma


Você já despertou ouvindo violinos? Já sentiu borboletas no estômago ao ver alguém? E um peixe nadando na sua coluna quando você pensa desagradável?

Algum dia ficou de cara no chão por ter jurado de pés juntos amor eterno a alguém que não chegava a seus pés?

Já pisou em nuvens usando seus chinelos velhos? Sentiu calor com uma erupção de vergonha na cara, colocou seus desejos num cofrinho e guardou no bolso o sabor da sua bala preferida?

Alguma vez fez um mapa do que seu globo ocular viu por aí ou fechou os olhos para o seu olho clínico? Sentiu cócegas no cérebro com pensamentos engraçados?

Você já degustou palpites, abriu envelopes de conselhos ou leu intenções nas entrelinhas de atitudes?

Viveu em pé de guerra com a desarmonia, tossindo calúnias e faiscando cólera?

Já botou a mão na consciência ou ficou de queixo caído por ter engolido a língua falando desassossegos?

Já ficou na mão, fora do ar, com o coração apertado, com a cara amarrada, nó na garganta, estômago embrulhado, câimbra na razão e sensibilidade à flor da pele?

Já digeriu insatisfação e dobrou a língua indo a uma feira de conclusões e botando a boca no mundo?

Pescou surpresas, sorriu elogios de mão beijada, lavou a alma com água de colônia e se vestiu de cautela para encontrar a velhice?

Você por acaso já mastigou críticas durante as horas intermináveis do seu relógio biológico, desembaraçou os nervos, deu o braço a torcer a uma dor-de-cotovelo ou trocou os pés pelas mãos engasgando insegurança?

Já passou a perna na lei por ter molhado a mão de alguém, saiu na mão com sua fúria por ter levado um pé na bunda ou deu no pé quando abriu mão de correr riscos?

Já livrou a cara por ter chorado inconsciência no ombro de alguém?

Sonhou seu avesso, acordou seu raciocínio com palavras de amor ou se arrepiou com a temperatura de um sussurro ao pé do ouvido?

Já empinou pipas no ar dos seus pulmões ou respirou alívio suspirando pelos cantos? Atirou pelos ares uma respiração ofegante em nome do bom senso?

Tremeu de segurança por dar de cara com a certeza?

Ficou com o pé atrás com seu coração, tentando controlar com mão de ferro seus sentimentos?

Já torceu o nariz para reprovações teimosas ou ficou com cara de tacho por constatar desilusões?

Já ficou na cara que você precisava pôr aos mãos para o céu por poder ficar com as pernas para o ar folheando o vento?

Ficou com a boca seca por falta de vocabulário, salivou vontades comendo-as com os olhos, emagreceu seus rancores e engordou sua conta bancária batendo boca com a economia?

Você já beijou lembranças abraçando saudades, chorou um mar de desgosto numa tempestade de desespero e se desequilibrou de sua sensatez perdendo seu jogo de cintura?

Já encheu a cara e deu com a língua nos dentes segredos inconfessáveis?

Já foi seqüestrado por um ataque de riso à mão armada, ficou refém de si mesmo numa crise de soluço ou fugiu de olho-gordo gritando aflição?

Já teve pensamentos entorpecidos pelo tempo, fechou a cara, tentou afogar as mágoas em um balde de gelo ou experimentou engolir contrariedades com um copo de licor?

Deu as caras metendo o nariz em festa, dançou a olhos vistos de mãos dadas com a solidão ou bateu de frente com o mau humor na mão dupla da diversão?

Já ficou de olho em conjecturas, enchendo os olhos de desejos, ou estendeu a mão para a esperança, colocando-a no colo?

Alguma vez, com a cara e a coragem, pegou no pé do seu medo sem receio de dar com o nariz na porta da ousadia?

Não?!

Não sabe a metáfora que está perdendo!


10 comentários:

Anônimo disse...

Great!
Posso passar esse texto para um prof. amigo meu que está trabalhando figuras de linguagens?
bjs

rafael fermiano disse...

"Alguma vez, com a cara e a coragem, pegou no pé do seu medo sem receio de dar com o nariz na porta da ousadia?"

É, peguei no pé do coitado(assim que o vejo hoje) e o carreguei até o topo de uma torre de cinquenta metros, o joguei lá de cima. Assim acabei com meu medo de altura. O problema foi a sujeira que ficou lá embaixo, hhhaha.

Dificil trabalhar com metáforas, e vc fez isso bem. Ótimo.

[]'s

Kandy disse...

Obrigada, gente! Jana, pode passar o texto para o seu colega. Tudo pela cultura! Fico feliz em colaborar com o ensino de metáforas... Rafael, fico bem feliz por você ter se livrado do seu medo. Geralmente, qualquer tipo de limpeza faz sujeira. ;-)

Anônimo disse...

Kandy...
Como vc consegue escrever assim tão bem ?
Que inveja !!! hahahahahahaha

Cada vez muda o meu texto favorito... esse concerteza é o melhor até agora na minha opinião. De verdade, estou impressionado, vc se superou nesse,
Mas eu sei que logo, vc ira me surpreender novamente e minha mutante opinião, sofrerá outra metamorfose.
(gostei dessa frase.. hahahahaha, preciso treinar pras aulas de roteiro ,né ? a palavra metamorfose esta certa nesse contexto, ou não tem nada a ver ?)
And.. now I remembered, it's been a while we don't talk in english, I'll try not to forget it...

Kisses....
(I'm waiting the text about Marisa Monte's concert, ok?

Anônimo disse...

Já, algumas. Outras, ainda faço!

Anônimo disse...

Hummm demais...
Sou seu fâ agora... como sempre né !
Ahh eu já quase vivi um pouco disso... mas preciso experimentar mais...
Bjs...

Anônimo disse...

Acho q vc me descobriu!!!hahahaha
Moça nem preciso falar nada né?
Não há palavras p/ te definir...
Eita mulher admirável!!!
Sou sua fã...vc já deve ter muitos né?
Parabéns!!
Muak!

Anônimo disse...

Nossa kandy!
to bobo...rsrsrsrrs
kra, muitas dessas sensações eu ja tive, mas todas ao mesmo tempo lendo um texto foi a primeira vez...rsrrsrsrs...foi uma viagem de conhecimento pelo meu corpo,,,até agora minha lingua ta enrrolada...bjuxxxxxxxxxxxxxx

Anônimo disse...

Eu já tirei leite de pedra, e o servi pra quem sempre me apedrejava com olhares de piedade azeda. Agora, pasto flores que cresceram no concreto da minha saudade. E assim, vou indo, né?

Bjs

Kandy disse...

lindas metáforas, Tuca! Você experimentou sensações bem interessantes! Devia explorar mais sua veia poética...